22/09/2010

Octaedro

Walter era um dos meus melhores amigos na idade de oito anos, estudávamos juntos e ele sempre dormia na aula. Walter, eu chamava. Walter, acorda!
Um olho abria lentamente e espiava, logo abrindo o outro e começando a narrar a coisa mais absurda do mundo com a qual acabara de sonhar. Repetia esse ritual toda manhã na primeira aula. Era o único amigo de escola que me havia restado depois que os professores decidiram dividir a turma com quem eu andava no ano anterior entre as salas de aula pra dividir o grupinho. Talvez tenha começado com isso o ódio por aquele colégio que só aumentou durante minha vida. Ríamos alto da história maluca que ele contava e lá vinha a tia, furiosa, exigindo silêncio. Impedidos de falar, ficávamos apenas olhando para a frente, aquele corpo suave e juvenil de professora de primário. Tenho certeza que foi assim que Walter aprender a distinguir as partes da anatomia feminina por baixo das roupas, ensinando-me o truque anos mais tarde. Era uma saída de colégio ao meio-dia quando ele virou pra mim e confidenciou: a profi tem um cetão!
Bastou isso para que eu percebesse, um tanto quanto tardiamente, o mundo feminino ao meu redor e o fenômeno natural da pata-de-camelo. Logo, logo comecei eu também a desenvolver os poderes perceptórios que ele me ensinava e passava a aula inteira parado, olhando o corpo das professoras, sem copiar nada. Ouvia a voz que explicava a matéria tentando construir em meu cérebro frases de súplicas sensuais. Gostava daquilo, muito mais do que o antigo método de assistir aulas, embora minhas notas começassem a declinar. Somente meu amigo compartilhava comigo deste estranho poder que tínhamos e foi um golpe quando ele foi para outra escola. Passei a zanzar sozinho pelos corredores, agora usando as técnicas que eu aprendera com todas as garotas que via, não só professoras. O último poder secreto que meu colega me ensinara antes de partir foi o de perceber e decifrar teorias da conspiração e mensagens subliminares. Todos estão atrás de você, estão te observando, esperando um passo em falso, ele dizia, e para descobrir o que eles querem basta ler as mensagens ocultas que eles trocam, palavras escondidas que se formam com a primeira letra de cada frase.
Claro que aquilo isso já era loucura demais pra minha cabeça. O poder de superpercepção era legal, mas aquele lance de mensagens subliminares já era demais. Mais vale viver de olhos fechados do que abri-los para descobrir o terror e a loucura.