28/10/2010

Os nazistas da esquina

Sabe, há contas que temos que acertar com o passado. Essa coisa, por exemplo, de botarmos a culpa de tudo nos nazistas, como pretexto até para perdoar os aliados pelas duas bombas que arrasaram duas cidades japonesas. Ou por querer eleger uma pessoa ou grupo como essência do mal, e nos abstermos de reconhecer a própria inoperância dos conceitos de mal e bem, que os impulsos destrutivos residem também em nós mesmos.
Há uma lei no mundo da argumentação que surgiu na usenet mas podemos aplicar para todo nosso mundo cotidiano, a Lei de Godwin, que diz que à medida que uma discussão cresce, ela certamente vai descambar para um lado chamando o outro de nazista. E como corolário, o lado que chamar o outro de nazista primeiro perde a discussão.
Chamar seu oponente de nazista ou fascista é o mingau com leite de eleições, até mesmo ex-presidentes se prestam a esse ridículo na eleição atual, chamando o lado opositor de nazista. E olha que fala de ex-presidente, em nossa triste história, é sempre algo coberto de inveja, rancor e falta de senso de ridículo.
Mas agora vem à tona outro caso de mais triste figura ainda, um ministro da suprema corte chamando a popular ficha limpa e seus apoiadores de nazistas. Aplicássemos a Lei de Godwin também na justiça e lá se ia um ministro automaticamente retirado de suas funções, embora não faltem mesmo movimentos para dar-lhe o primeiro impeachment de nossa história judicial, por conta dos inúmeros constrangimentos a que tal figura tem exposto a corte em que milita partidariamente.
Sabendo-se do amplo apoio à lei da ficha limpa, o magistrado acaba de chamar mais da metade dos brasileiros de nazifascistas. Se o magistrado virou senil ou vocês leitores viraram adeptos fanáticos do Mein Kampf do dia para noite, é algo que deixo a vocês decidirem. O fato é que afirmações desse tipo não só desgraçam nossa vida republicana, como cria os fantasmas que pretende combater. Quantos novos candidatos ao nazismo o ministro não cria ao associa-lo à tal lei?
Aqui em Santa Catarina, onde até o estupro a lei permite, desde que o pai seja dono de canal de TV, o nazismo nunca saiu de moda, embora submerso. Não é à toa que saiu daqui a iniciativa de barrar a lei que permite acesso de negros às universidades, ou os dois terços conservador de nosso eleitorado.
Por isso é hora de jogar fora a máscara e entendermos que nazistas não são seres de outro planetas, são nossos vizinhos, parentes, colegas. Algo que não se vence com guerras.