17/11/2010

O velho vestibular

As eleições mal acabaram e a campanha pra 2014 já começou. É o novo paradigma da propaganda política, a criação de uma crise permanente, seja ela fundada em bases reais ou não. A bola da vez agora é tentar prejudicar mais de três milhões de estudantes anulando uma prova que fizeram apenas para desgastar o governo. Ano passado já fizeram isso, curiosamente o jornal que publicou a prova vazada era a mesma empresa dona da gráfica que deixou vazar o conteúdo. Coincidências, é claro.
Nessa guerra de informações vale tudo, até mesmo pegar uma frase qualquer de uma autoridade e fazer um artigo inteiro para dar um sentido inverso. É impressionante mesmo, Fausto Wolff estava certo sobre o romance de Orwell, estamos vivendo o 1984 desde 1964. Na histeria do momento não falta quem queira cancelar o modelo de avaliação nacional, similar ao feito na Alemanha e EUA, e voltarmos para o antigo sistema do vestibular apenas.
Ah, sim, doces memórias do vestibular. Lembro que o grande truque era se inscrever naqueles aulões de fim de ano, onde todo o conteúdo era condensado em 20 dias de aula. E os professores eram aclamados como verdadeiros gênios porque “adivinhavam” as questões do vestibular, um misto de ensino científico e xamanismo premonitório.
É claro que ninguém mais é criança e podemos parar de brincar nessa história. Os professores de cursinho são contratados pelas universidades para redigir questões de vestibular, daí vem o seu dom premonitório: o aluno que paga recebe dele a informação privilegiada sobre as questões que cai. É claro que eles não podiam admitir que estavam violando o sigilo da prova, então vinham com papos divertidíssimos de sonhos mediúnicos e passavam no quadro questões inteiras do vestibular, palavra por palavra, cada alternativa, com a devida resposta.
Era um esquema que todos gostavam. Os cursinhos porque faturavam, os alunos porque ganhavam uma vantagem indevida sobre outros candidatos e os professores porque viravam gênios do saber. Depois era divertido ver ainda os cursinhos que se vangloriavam da aprovação dos seus alunos, sem mencionarem, é claro, o crime federal que cometiam vazando questões da prova para os mesmos.
É certo que a fraude começa a patinar no momento em que surge um exame nacional que desarticula todos esses arranjos locais de corrupção. Não é, portanto, de se estranhar que o exame desagrade e cause movimentações tentando exterminá-lo para o retorno ao velho esquema. Ah, o saudosismo!